Curva de Bradley: Como Evoluir a Cultura de Segurança do Trabalho na Sua Empresa

Descubra como a Curva de Bradley, desenvolvida pela DuPont, pode ajudar sua empresa a transformar segurança do trabalho de uma obrigação legal para um valor essencial. Um guia prático sobre a evolução da cultura de SST.

SEGURANÇA DO TRABALHO

6/6/20255 min read

Nos últimos anos, temos acompanhado uma transformação significativa no modo como as empresas encaram a segurança e a saúde no trabalho (SST). O que antes era visto como apenas uma obrigação legal ou um item de checklist, hoje se consolida como um pilar estratégico essencial para a sustentabilidade das organizações. Mas alcançar um nível de excelência em SST não acontece da noite para o dia. É preciso trilhar uma verdadeira jornada de maturidade, construída com base em princípios, valores e muita consistência.

Neste artigo, vamos explorar o conceito de jornada de maturidade em SST, utilizando como referência o reconhecido Modelo DuPont, que se consolidou ao longo de mais de dois séculos como um exemplo de comprometimento com a segurança. Além de entender as fases dessa evolução, refletiremos sobre como cada estágio influencia a cultura organizacional e o comportamento dos trabalhadores.

Segurança do Trabalho: muito além do cumprimento da lei

Embora avanços notáveis tenham sido alcançados, ainda enfrentamos números preocupantes de acidentes e doenças ocupacionais. A verdade é que, por mais que invistamos em equipamentos, treinamentos e normas, a segurança só se torna realmente eficaz quando passa a ser parte integrante da cultura da empresa. E isso requer uma mudança de mentalidade — de todos os níveis, do chão de fábrica à alta liderança.

Nesse contexto, modelos de jornada de maturidade surgem como ferramentas poderosas para diagnosticar onde a organização está e para onde ela pode evoluir. Eles ajudam a entender que a excelência em SST é um processo contínuo, e que os resultados sustentáveis só aparecem quando há uma mudança cultural profunda.

A origem do modelo DuPont: uma história de aprendizados difíceis

A DuPont, multinacional de origem americana, é uma das empresas mais antigas e respeitadas no campo da segurança. Fundada em 1802, nos Estados Unidos, por Eleuthère Irénée DuPont, um químico francês e discípulo de Lavoisier, a empresa começou sua trajetória como uma fábrica de pólvora negra.

Desde o início, havia uma preocupação real com a segurança dos trabalhadores. As instalações da fábrica contavam com alojamentos para os empregados e suas famílias e um projeto arquitetônico inovador que visava conter explosões. Ainda assim, a tragédia bateu à porta nos primeiros anos de operação:

  • 1811: surgem as primeiras regras formais de segurança da empresa.

  • 1815: uma explosão em um moinho de pólvora mata 8 pessoas.

  • 1818: uma nova explosão, ainda mais devastadora, tira a vida de 36 pessoas, inclusive membros da própria família DuPont.

Esses eventos marcaram profundamente a cultura da empresa. A DuPont entendeu que segurança não deveria ser apenas uma prioridade temporária, mas sim um valor inegociável. A partir daí, a companhia passou a desenvolver práticas de segurança robustas, tornando-se referência mundial na área.

A Curva de Bradley: como evoluímos em SST?

A jornada de maturidade da DuPont foi ilustrada por um de seus executivos através da conhecida Curva de Bradley, que representa o caminho evolutivo das organizações em direção à excelência em segurança. Essa curva é dividida em quatro estágios: reativo, dependente, independente e interdependente.

Vamos entender cada uma dessas fases e o que elas significam no dia a dia de uma empresa.

1. Estágio Reativo: o despertar para o problema

Este é o ponto de partida de muitas organizações. A atuação em SST é limitada e basicamente responde a acidentes após eles acontecerem. Não existe um planejamento estruturado, tampouco uma cultura de prevenção. O acidente é visto como inevitável, algo que "faz parte do trabalho".

Nesse estágio, o “zero” (zero acidentes, zero fatalidades) parece impraticável. A lógica dominante é a de que o dano é consequência natural das atividades realizadas, principalmente em setores de maior risco, como construção, mineração ou indústrias químicas.

2. Estágio Dependente: quando o cumprimento vira regra

Aqui, começa a haver uma organização maior. Procedimentos e normas são estabelecidos, e a figura do supervisor ganha destaque como guardião da segurança. As pessoas passam a seguir regras, muitas vezes por medo de punição, e não por real consciência.

O discurso organizacional já valoriza a segurança, mas ela ainda não é incorporada como um verdadeiro valor. A crença predominante é a de que, mesmo com cuidado, acidentes continuam sendo prováveis. A segurança é prioridade, mas uma prioridade que pode mudar conforme a pressão da produção.

3. Estágio Independente: a consciência individual floresce

Neste estágio, a empresa dá um salto. Os trabalhadores começam a internalizar os princípios de SST. A responsabilidade individual se fortalece: cada um faz a sua parte.

A organização começa a acreditar que o “zero” é possível, mas ainda o vê como algo circunstancial. Quando tudo colabora (recursos, tempo, liderança), o acidente é evitável. Porém, quando a pressão aumenta, a segurança pode ser deixada de lado.

Esse estágio revela uma evolução importante, mas ainda há uma fragilidade: o foco está no indivíduo. A cultura de segurança ainda não é coletiva.

4. Estágio Interdependente: segurança como valor compartilhado

Este é o estágio de maturidade desejado — o ideal a ser perseguido. Aqui, a segurança passa de prioridade para valor absoluto. Isso significa que ela não está mais sujeita às urgências da produção ou às metas de curto prazo.

A grande virada ocorre quando a cultura de SST é compartilhada por todos, de forma interdependente. As pessoas cuidam umas das outras, não apenas de si mesmas. Há confiança, diálogo aberto e um compromisso coletivo com o zero por escolha.

A lógica é clara: se não dá para fazer com segurança, então não se faz. Fecha-se a mina, para-se a linha de produção ou revê-se todo o processo. Isso pode parecer radical, mas é justamente essa postura que diferencia empresas sustentáveis das que apenas reagem a crises.

Segurança como valor: o que isso muda?

Ao longo dessa jornada, uma transformação profunda ocorre: a segurança deixa de ser uma “obrigação” e passa a ser um elemento central da identidade da empresa. Quando ela é apenas uma prioridade, pode ser substituída por outras demandas. Mas quando se torna um valor, ela prevalece — mesmo diante de pressões intensas.

Empresas que atingem o estágio interdependente:

  • Promovem uma liderança engajada e exemplar.

  • Valorizam o feedback e a participação dos trabalhadores.

  • Investem constantemente em inovação e melhoria contínua.

  • Estimulam uma cultura de cuidado genuíno e responsabilidade compartilhada.

Essas empresas entendem que segurança não é custo, mas sim investimento em pessoas, em reputação e em longevidade.

Como aplicar esse modelo em sua empresa?

Se você está se perguntando como implementar esse modelo na prática, aqui vão algumas sugestões:

  1. Diagnostique em que estágio sua empresa está. Seja honesto e envolva todos os níveis hierárquicos nessa análise.

  2. Engaje a liderança. Sem o exemplo do topo, nenhuma mudança cultural acontece de verdade.

  3. Comunique com clareza. Fale sobre segurança de forma frequente, humana e inspiradora.

  4. Incentive a participação ativa dos trabalhadores. Ouvir quem vive o risco todos os dias é essencial.

  5. Celebre as conquistas. Reconheça os avanços e torne a jornada visível para todos.

A jornada de maturidade em SST é um caminho que exige tempo, consistência e compromisso verdadeiro com a vida. A história da DuPont nos mostra que até mesmo grandes empresas aprenderam com os erros e tragédias do passado, e que a excelência só é possível quando a segurança se torna um valor inegociável.

Mais do que evitar acidentes, promover uma cultura de segurança é sobre cuidar de pessoas, preservar talentos e construir um futuro sustentável para todos.